Tsutomu Aoki, Thomas Gabriel Miklos, Nilka Fernandes Donadio, Nilson Donadio, Gabriel Monteiro Pinheiro
O estudo do fator uterino em infertilidade é peculiar, pois envolve a parte corporal e a cervical, e é por isso que são estudados à parte. A incidência varia de 20% a 30%. É considerado em boa parte das mulheres como um fator relativo de infertilidade, isto é, a despeito do encontro do fator uterino, muitas delas engravidam, independentemente do achado diagnóstico.
Quando da impossibilidade do tratamento do útero, que e a matriz onde o feto se desenvolve, temos a derradeira chance para gestar com as modernas técnicas de reprodução assistida, usando a técnica de doação temporária do útero.
No estudo do fator corporal uterino destacam-se: mioma uterino, adenomiose, pólipo endometrial, sinéquia uterina, malformações müllerianas e hiperplasia endometrial.
Os leiomiomas uterinos podem acometer até 50% das mulheres. Estima-se que 20% dos casais podem apresentar quadro associado de infertilidade conjugal. A etiologia não é totalmente compreendida. Dentre as diversas teorias, a mais aceita sugere que é originado de células monoclonais, que sofrem mutações somáticas, com perda de controle de sua proliferação.
O desenvolvimento do mioma uterino envolve fatores genéticos e de crescimento, hormônios esteroides e citocinas, entre outros. Admite-se que o estrogênio exerça papel preponderante na etiologia dos miomas uterinos; de fato, sua prevalência é maior na menacma, diminui ou até desaparece após a menopausa, e ressurge na vigência da terapia de reposição hormonal.
Quanto à localização, os miomas uterinos podem ser submucosos, intramurais e subserosos, sendo que os dois primeiros é que podem interferir de forma direta na fertilidade por deformar a cavidade uterina, obstruir tubas uterinas, alterar a anatomia tubo-ovariana, influir na contratilidade uterina, dificultando a nidação, causar inflamação crônica do endométrio, secretar mais quantidade de enzimas endócrinas e dificultar a saída do fluxo menstrual.
Os miomas uterinos podem ser causadores de infertilidade, a depender da localização, do número e do tamanho. É um fator relativo de infertilidade. As queixas das mulheres com infertilidade e mioma uterino podem ser as mais variáveis. Consistem do aumento do fluxo menstrual, sensação de peso no baixo ventre, dor pélvica com irradiação para a região lombossacra e membros inferiores, dispareunia, aumento do volume abdominal, e sinais de compressão do trato intestinal ou do aparelho urinário. Cabe lembrar que grande parte das acometidas se mantém assintomática.
O tratamento conservador ou cirúrgico somente será instituído quando for definido se a causa da infertilidade é o mioma. O mioma uterino é um fator relativo de infertilidade.
Estudos comparando as várias técnicas de miomectomia não encontraram diferenças em relação à taxa de gravidez. Importante é a lembrança de que a cicatriz uterina, após a miomectomia, aumenta o risco de ruptura uterina nas futuras gestações.
Adenomiose é doença uterina caracterizada pela presença de tecido endometrial funcionante – estroma e glândulas, difusamente distribuída na intimidade do miométrio, que é a mais comum; ou aglomerada, que é o adenomioma. As teorias etiopatogênicas relacionam com: invaginação da mucosa endometrial, traumas obstétricos e cirúrgicos e metaplasia do novo tecido endometrial intramiometrial ectópico.
A implantação do endométrio no miométrio pode levar à hipertrofia das fibras musculares uterinas, com aumento do volume do órgão. Em mulheres acometidas por adenomiose, é frequente a presença de nódulos miomatosos no útero.
As manifestações clínicas consistem em aumento do fluxo menstrual (menorragia), cólicas menstruais (dismenorreia) de intensidade progressiva. Associa-se comumente À multiparidade, ao tabagismo e à manipulação cirúrgica anterior.
Trata-se de neoformação da mucoso endometrial que se origina com hiperplasia focal da camada basal, revestida de epitélio e contendo quantidade variável de glândulas, estroma e vasos sanguíneos. Do ponto de vista histológico, podem ser hiperplásicos, atróficos, funcionais, adenomiomatosos e adenoma polipoide atípico, portanto todos dependentes, em grande parte, de atividades endócrinas.
São tratados pela polipectomia histeroscópica, por meio de ressectoscópio bipolar, utilizando-se como meio de distensão o soro fisiológico. É imperativo que se solicite o exame anatomopatológico. É descrito aumento das taxas de gravidez em duas vezes, após a realização da polipectomia histeroscópica. Acredita-se, segundo trabalhos, que achado de pólipos endometriais não interfira nas taxas de gravidez e abortamentos em pacientes submetidas às técnicas de reprodução assistida; portanto, não há indicação formal de polipectomia antes desses procedimentos. Em pacientes com quadros de abortamentos de repetição com pólipos endometriais, deve-se proceder à exérese dos mesmos, a despeito de não haver correlação direta entre abortamentos e presença de lesões polipoides.
A hiperplasia endometrial representa a expressão morfológica da estimulação estrogênica crônica, quer endógena, quer exógena, não contrabalançada pela ação da progesterona. As hiperplasias são classificadas de acordo com a possibilidade de transformação em adenocarcinoma que, evidentemente, quanto mais atípica e complexa, maior será o risco de desenvolvimento do carcinoma. A classificação mais aceita sobre a hiperplasia endometrial é a da Sociedade Internacional de Patologias Internacionais, a seguir discriminadas: simples – sem e com atipias; complexa – sem e com atipias.
Kurman (1985), em estudo sobre hiperplasia, observou um risco de progressão para carcinoma de 1% na simples, sem atipias nucleares, e 3% na complexa, sem atipias nucleares. O mesmo estudo mostrou que 8% dos casos de hiperplasia simples, com atipias nucleares, e 29% das complexas, com atipias nucleares, progrediram para carcinoma.
As malformações müllerianas ou anomalias uterinas são resultantes do desenvolvimento anormal dos dutos paramesonéfricos ou müllerianos. Incidem de 7% a 10% em pacientes inférteis, sendo acompanhadas em 25% de malformações urinárias. As malformações uterinas estão associadas à infertilidade, isto é, dificuldades de se manter a gestação e não à capacidade de conceber, que é esterilidade.
Dentre as anomalias uterinas, as mais comuns de se encontrar são: septo uterino, útero bicorno, útero didelfo, útero unicorno, agenesia de vagina e agenesia cervical.
Pode causar infertilidade porque sua vascularização é diminuída, dificultando a nidação. Há ocorrência de alta taxa de abortamento e de partos prematuros. O septo uterino pode ser parcial ou total. Está associado à endometriose em 30% dos casos. D
O objetivo é a melhora das taxas de gravidez. Associado a abortamentos de repetição, a cirurgia visa à obtenção de gestações a termo. A cirurgia vídeo-histeroscópica é a mais utilizada. Consiste em ressecar o septo endocavitário, que pode ser parcial ou total, tornando a cavidade mais ampla. Preconiza-se usar no pós-operatório imediato dispositivo intrauterino ou cateter intrauterino com balão. Apesar de não haver evidências científicas, opta-se pela antibioticoterapia profilática e o uso de fármacos estroprogestativos, de forma cíclica.
Quando o septo é de base larga, opta-se pela cirurgia de Bret-Palmer, realizada por laparotomia, tornando suas hemicavidades pequenas em uma de maior cavidade.
Pode causar infertilidade porque sua vascularização é diminuída, dificultando a nidação. É formado quando há incompleta fusão dos dutos müllerianos, com um único colo e duas cavidades endometriais. Há ocorrência de elevada taxa de abortamento e de partos prematuros. É responsável por 25% de anomalias uterinas. Está associado à endometriose em 30% dos casos.
O objetivo é a melhora das taxas de gravidez. Associado a abortamentos de repetição, a cirurgia visa à obtenção de gestações a termo. A cirurgia videolaparoscópica seria a mais bem indicada, pelo fato de ter menos processo aderencial. Essa técnica deve ser realizada por experientes cirurgiões. Tanto a técnica laparoscópica quanto a laparotômica visam a criar uma cavidade única, sendo que a técnica preconizada é a de Strassman. Recomenda-se a cerclagem profilática. Apesar de não haver evidências científicas, opta-se pela antibioticoterapia profilática, prometazina e uso de fármacos estroprogestativos, de forma cíclica.
Outras anomalias uterinas como: útero unicorno, útero didelfo, agenesia vaginal, agenesia cervical devem ser estudados, caso a caso. O útero unicorno, geralmente, é assintomático. Quando existem resquícios funcionantes do outro útero, pode ser necessária sua remoção cirúrgica, pois pode haver endométrio funcionante e msmo coexistir endometriose pélvica.
Quando ocorre a presença do útero didelfo, isto é, quando não há fusão dos dutos de Müller, a mulher apresenta dois hemiúteros e dois colos, com duplicação vaginal ou não. Quando sintomática, orienta-se para a ressecção do septo vaginal. Podem ocorrer abortamentos de repetição e, neste caso, a técnica preconizada para o aumento da cavidade uterina é a de Strassman.
Se a paciente apresentar agenesia vaginal, comumente associada a malformações uterinas e cervicais, caracterizando a síndrome de Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser, nada se pode fazer em termos de fertilidade.
Descrita por Asherman, a sinéquia uterina é a presença de aderências na cavidade endometrial, Surge como uma alteração endometrial provocada por quaisquer formas de traumatismos locais, que pode ser mecânica ou infecciosa, e que leva à obliteração parcial ou total da cavidade uterina e/ou do canal cervical, com alterações do fluxo menstrual e que pode chegar a amenorreia.
Suspeita-se de fator cervical quando o escore cervical no período periovulatório é baixo, com alterações cervicais e resposta inadequada às ações hormonais locais ou por lesão cervical. O escore cervical, para ser bem estabelecido, pode ser complementado pelo teste cromático de Ferrari, pelas avaliações das provas de interação muco-sêmen (teste de Sims-Huhner), ultrassonográficas do ciclo endometrial e ovariano.
O fator uterino cervical de causa anatômica é de fácil diagnóstico, mas de difícil tratamento. As correções cirúrgicas não apresentam resultados satisfatórios. Quando se apresenta com sinéquia de orifício cervical a dilatação simples com velas, ou mesmo a histeroscopia diagnóstica podem facilitar a resolução do problema. Mas a melhor alternativa para ultrapassar a barreira lesada seria indicada a inseminação artificial homóloga, isto é, inseminação com o sêmen preparado do próprio marido, realizado evidentemente no período periovulatório. A monitorização para a inseminação artificial homóloga é feita pela ultrassonografia pélvica seriada, escore cervical máximo e dosagem de estradiol adequado. Quando necessário, usa-se estrogênio; para ação local, deve-se usar estriol por via oral.
Dentre tantos fatores que podem causar a esterilidade conjugal, o fator tuboperitoneal ganha destaque maior em nosso meio. As afecções tubárias quase nunca aparecem isoladamente, daí a denominação de fator tuboperitoneal. A incidência varia de 30% a 35% nos mais diversos serviços de esterilidade, chegando, em alguns destes, a mais de 50%.
Para melhor compreensão da esterilidade de causa tuboperitoneal, é importante lembrar a anatomia da tuba uterina, que apresenta porções intersticial ou intramural, ístmica, ampolar e pavilhão ou fimbrial. A sua integridade vai facilitar os mecanismos de captura ovular, na capacitação espermática, no transporte e ativação espermática, na fertilização do oócito pelo espermatozoide no terço distal da tuba uterina, no transporte do ovo ao útero e na implantação do mesmo no endométrio (na forma de blastocisto).
Na anamnese de esterilidade feminina por fator tubário, deverão ser lembradas: história de Doença Inflamatória Prévia (DIP), endometriose, cirurgias pélvicas ginecológicas ou não que envolvam útero, ovários, tubas uterinas (gravidez ectópica tubárica, ligadura tubárica, salpingoplastias, metroplastias, ooforoplastias, apendicite infectada, curetagem uterina por aborto infectado), alças intestinais, aparelho urinário, malformações müllerianas e tuberculose.
Lembrar que uma das grandes causas de infertilidade por fator tuboperitoneal são as sequelas de infecções pélvicas. Wëstrom (1994) relata que a Doença Inflamatória Pélvica (DIP) pode causar infertilidade feminina na seguinte incidência: 10% a 12% após um episódio de infecção; 23% a 35% após dois episódios; e 54% a 75% após três episódios. Mulheres que tiveram DIP apresentam risco de gravidez tubária aumentada em seis a sete vezes.
Os agentes etiológicos mais comuns são a Neisseria gonorrhoeae e a Chlamydia trachomatis. com infecções ascendentes intracanaliculares, que provocam grandes danos no endossalpinge. A DIP pode provocar, além dos danos tubários e abscessos nos recessos retouterinos, disseminação pela goteira parietocólica, formando como sequelas aderências entre a superfície hepática e parede abdominal anterior, chamadas de aderências “em corda de violino” ou síndrome de Fitz-Hugh e Curtis, associadas às dores no hipocôndrio direito, dores referidas no ato de correr ou ao caminhar.
Pacientes com história de cervicites infectadas podem também apresentar infecções tubáricas por via ascendente extracanalicular, com disseminação linfática provocando lesões tubárias, principalmente nas regiões ístmica, ampolar e periovárica. A tuberculose pode provocar infecção abdominopélvica por via descendente ou hematogênica. Dentre os órgãos pélvicos, o mais atingido são as tubas uterinas.
O exame físico e especificamente o exame do abdome são insuficientes para descartar o fator tuboperitoneal. No exame ginecológico, o toque vaginal bimanual pode nos dar informações sobre espessamentos anexiais ou dores neste local, inferindo-nos da possibilidade de se ter suspeitas de doenças tubárias. Podemos sentir a imobilidade do colo uterino devido ao bloqueio aderencial ou suspeita de endometriose pélvica profunda. A referência de dores profundas ao toque vaginal uidigital nos leva a pensar em endometriose pélvica profunda com repercussões tubárias.
A HSG é fundamental e prática para avaliar a cavidade uterina, as tubas uterinas e sua dispersão peritoneal. As afecções que acometem as tubas uterinas e consequentemente as aderências pélvicas podem ser radiologicamente visualizadas, dentro dos limites que o exame permite.
As malformações müllerianas tubárias podem ser proximais, ístmicas ou distais. Vistas na HSG, ou verificá-las simultaneamente em vários lugares sob a visão laparoscópica.
As obstruções tubárias orgânicas proximais ao útero são achados de sequelas de endometrite pós-aborto ou pós-parto, de ligadura tubárica, de esterilização histeroscópica, de retirada cirúrgica de tuba proximal, de injeções de produtos irritantes com fins abortivos.
A obstrução tubária proximal pode se estender para o segmento ístmico, e raramente atinge a região distal, a ampolar. As obstruções da região intermediária ou ístmica ocorrem por um conjunto de lesões de etiologia e natureza das mais variadas, tais como: aderências velamentosas, que podem tirar as tubas de seu sítio natural, sequelas de inflamação das pregas do endossalpíngeo, de endometriose, de ligaduras tubárias, de salpingectomia e de tuberculose.
As sequelas da DIP podem se apresentar sob a forma de obstrução distal como uma dilatação desta porção, o hidrossalpinge, com ou sem pregas no endossalpinge, a depender da via de infecção. Às vezes, essa hidrossalpinge pode ser parcial, isto é, com passagem parcial do contraste e é denominado hidrossalpinge aberto.
Frequentemente, o hidrossalpinge é acompanhado por processos aderenciais, que tiram a tuba uterina do seu sítio normal, elevando-a. Daí a denominação de fator tuboperitoneal . Apesar de a HSG não ser um método adequado para o diagnóstico de aderências peritubárias, o exame radiológico pode levar à suspeita diagnóstica quando se apresentam sob a forma “em chaminé”, “botão rosa” e halos peritubários.
As sequelas radiológicas da tuberculose tubária ganham características próprias, com imagens rígidas, constantes, obstruindo-as em várias porções, dando imagens típicas, como: “em raquete” ou “taco de golfe”, em “contas de rosário”, em “fio de arame”, ou imagens terminais em “cruz-de-malta” ou em “roseta”.
A endometriose pélvica pode provocar processos inflamatórios e, como consequências, alterações tuboperitoneais radiológicas já descritas. Algumas imagens podem coexistir com a endometriose, tais como: pólipos tubários proximais, elevação dos cones pré-tubários e colonização da região peritubária intersticial ou “favo de mel”. Esta última pode também estar relacionada ao quadro salpingite ístmica nodosa.
As ligaduras tubárias podem provocar obstruções visualizadas radiologicamente e localizadas na região tubária proximal, região tubária ístmica e na região tubária distal, que pode ser ampolar e fimbrial. As confirmações destas últimas localizações são vistas somente à laparoscopia.
Quando a paciente é alérgica ao componente iodado utilizado na realização da histerossalpingografia, podemos nos valer da histerossonografia ou sono-histerossalpingografia, que consiste na infusão salina estéril, e verificar a passagem de coluna líquida, demonstrando permeabilidade tubária. É de acurácia bem limitada. Esse exame ganha importância quando a paciente apresenta quadro de Esterilidade Sem Causa Aparente (Esca), e são encontrados achados, tais como: espessamento ecoendometrial incompatível com a fase do ciclo menstrual, localização mais precisa de lesões endometriais (miomas, pólipos e sinéquia uterina), abortamentos de repetição e permeabilidade tubária.
A aplicação da ultrassonografia pélvica por via vaginal no diagnóstico do fator tuboperitoneal é muito restrita, a não ser quando da presença de imagem tubular periovárica, associada a quadro de DIP anterior com possível formação de hidrossalpinge. Os processos aderenciais não podem ser vistos à ultrassonografia pélvica.
Laparoscopia ou videolaparoscopia é o procedimento endoscópico que possibilita a visão da cavidade pélvica para fins diagnósticos, bem como para terapêutica cirúrgica.
A videolaparoscopia, além de ser útil no diagnóstico, por avaliar todos os órgãos e estruturas pélvicas, é utilizada para a realização de biópsias dirigidas e procedimentos cirúrgicos. Uma de suas grandes vantagens é que ela propicia rápida recuperação pós-operatória, com curta permanência hospitalar, acrescida de baixa incidência de sequelas, torna a cirurgia endoscópica mais econômica e de menor custo social do que a cirurgia convencional.
A videolaparoscopia é considerada o padrão-ouro na investigação das alterações tuboperitoneais. Está indicada conforme a história clínica da paciente, tais como: queixas anteriores de doença inflamatória pélvica; fortes indícios de endometriose pélvica; second look de cirurgias pélvicas anteriores, principalmente relacionadas ao útero, tubas uterinas e ovários; cirurgias intestinais; cirurgias do trato urinário; malformações müllerianas; gravidez ectópica tubária; desejo de reversão tubária pós-ligadura e tuberculose.
Histeroscopia ou vídeo-histeroscopia é o procedimento endoscópico que possibilita a visão do colo uterino, do istmo e da cavidade uterina para fins diagnósticos e terapêuticos cirúrgicos.
A histeroscopia diagnóstica é um procedimento realizado de forma ambulatorial, na grande maioria das vezes. A histeroscopia é de grande auxílio no diagnóstico de algumas lesões tubárias proximais. Possibilita a visualização do óstio tubário interno e do segmento da porção intramural da tuba. Dentre os achados anormais incluem-se pólipo tubário, pequenas sinéquias, salpingite ístmica nodosa e obstrução parcial do óstio, muitas vezes elucidando casos de Esterilidade Sem Causa Aparente (Esca).
Os resultados em relação às gestações da videolaparoscopia cirúrgica são semelhantes aos da abordagem laparotômica por microcirurgia. As vantagens do método endoscópico às pacientes são as inerentes ao procedimento, com menor agressão cirúrgica, menor tempo de internação, redução da formação das aderências e rápido retorno às atividades.
As cirurgias das obstruções tubárias, sequelas de ligadura tubária localizadas na região ístmica, são aquelas que apresentam o melhor prognóstico em relação aos resultados positivos.
Os resultados em relação às gestações por anastomose tubária por microcirurgia chegam de 70% a 80%. A literatura informa resultados variáveis de 35% a 80% de positividade quando a técnica utilizada é a anastomose cirúrgica por videolaparoscopia. Para chegar a resultados tão promissores, a equipe cirúrgica deverá ter um treinamento intenso de técnica operatória endoscópica, aliada às boas indicações.
Quando a lesão tubária por proximal, pode-se valer da técnica do reimplante tubário, cujos resultados nas melhores estatísticas não ultrapassam 45% de gestação normal. As técnicas de reprodução assistida com fertilização in vitro têm indicação precisa nesses casos. Quando a lesão tubária for distal, com formação de hidrossalpinge, o estudo prévio deste local deverá ser feito com muito cuidado. Uma boa interpretação da Histerossalpingografia (HSG), um estudo minucioso do endossalpinge pela salpingoscopia orientará a opção cirúrgica, que poderá ser uma salpingostomia terminal ou salpingoneostomia, realizada por videolaparoscopia ou microcirurgia laparotômica. As taxas de gestação variam, segundo a literatura, de 20% a 35%, com aumento da taxa de gestação ectópica tubárica, chegando de 5% a 18%.
Pacientes com hidrossalpinge, com idade menor que 35 anos, que tenham sido submetidas à Fertilização In Vitro (FIV) sem sucesso, poderão ser submetidas à salpingectomia videolaparoscópica profilática, antes de novo ciclo de FIV, tendo em vista que foi demonstrado que o hidrossalpinge para drenar fluidos para a cavidade endometrial com material citotóxico, interferindo na interação entre embriões e o endométrio, resultando em falha de implantação. Segundo Schlaff et al (1990), pacientes que apresentam somente o fator aderencial, a taxa de gravidez por lise de aderências chega a 50%; se a lesão for por obstrução tubária distal, com lesão leve, chega a 80%; com lesão moderada, a 30%; e lesão grave, a 15%.
A fisiopatologia da endometriose estádios I e II, com mínimas formações aderenciais e infertilidade, são controversas e o tratamento se torna empírico. Nas pacientes com mais de 35 anos de idade, considera-se razoável realizar-se a videolaparoscopia para ressecção de focos de endometriose e lide de aderências. Em estudos randomizados e controlados, mulheres com endometriose estádios I e II, portanto, pequenas aderências, têm mostrado que a lise de aderências, ablação ou excisão de implantes de endometriose melhoram a fertilidade. Nestes casos, pode-se orientar para indução ovulatória com citrato de clomifene, associado ou não à inseminação intrauterina. Não ocorrendo a gestação em um período de seis meses, pode-se optar pela reprodução assistida, mais especificamente pela fertilização in vitro.
Pacientes inférteis com endometriose estádios III e IV, portanto com fator tuboperitoneal associado, poderão ser orientadas diretamente à fertilização in vitro. Importante meta-análise, realizada em 2002, por Barnhart et al, de estudos observacionais comparando pacientes inférteis com endometriose avançada, submetidas à técnicas de reprodução assistida, demonstraram menores taxas de gravidez quando comparadas às pacientes com fator tubário. No entanto, outros trabalhos, a despeito de indicarem marcadores piores em mulheres portadoras de endometriose avançada, demonstraram taxas de implantação e de gravidez semelhantes, quando comparadas a mulheres com fator tubário.
O tratamento clínico é controverso e, às vezes, ineficaz. Os ensaios clínicos randomizados de forma consistente relatam que a terapia hormonal com agentes como os progestagênios, o denazol ou agonista de GnRH para a supressão de endometriose não melhoras as taxas de fertilidade ou gravidez.
Ao realizar qualquer ato cirúrgico que envolva o fator tuboperitoneal, apesar de os resultados serem controversos, optamos pela utilização intraoperatória de irrigação constante do campo operatório com solução de ringer lactato, heparina; corticoide e prometazina poderão ser utilizados por via sistêmica.
As alterações ovulatórias estão presentes de 15% a 25% dos casais, podendo atingir até 40% entre os fatores femininos. Fisiologicamente e de forma resumida, a ovulação depende da função adequada do eixo hipotálamo-hipófise-ovariana. Alterações desses eixos promovem quadros de anovulação ou oligovulação.
Informações importantes no fator ovariano são: história menstrual, que pode ser o único método para se avaliar a ovulação; puberdade tardia e menarca quando tardia frequentemente apontam para ciclos anovulatórios; ciclos regulares entre 25 e 35 dias, com sintomas pré-menstruais provavelmente são ciclos ovulatórios em 95% dos casos; ciclos menstruais com intervalos superiores a 35 dias podem indicar ciclos anovulatórios; presença da doença da tireoide; uso de medicações citotóxicas, neurolépticas, antidepressivas, entre outras, que atuam no eixo hipotálamo-hipofisário; antecedentes de cirurgias ovarianas; excesso de exercícios físicos; ganho excessivo de peso.
O exame físico e ginecológico deve ser efetuado da forma mais completa possível. Atente-se a toda a propedêutica que deverá ser aplicada, independentemente do caso a ser estudado.
Deverão ser também avaliados: Índice de Massa Corpórea – IMC (fração peso sobre altura ao quadrado – normal até 25), que quando elevado apresenta maior chance de ciclos anovulatórios; observar caracteres sexuais secundários (disgenesia gonodal); distribuição da pilificação (hiperandrogenismo); avaliação da tireoide; Acantose nigricans; secreção mamária (galactorreia na hiperprolactinemia); trofismo do colo uterino e da parede vaginal; volume do útero e dos ovários; características do muco cervical.
No ciclo menstrual normal com ciclos ovulatórios, a curva de temperatura basal se apresenta de forma bifásica. A temperatura é medida colocando-se o termômetro na região sublingual e a mensuração é realizada diariamente ao acordar. Quando o ciclo é ovulatório, a progesterona produzida pelo corpo lúteo atua no sistema nervoso central, mais especificamente nos centros termorreguladores do hipotálamo, promovendo aumento de 0,3°C a 0,5°C na temperatura basal durante a fase lútea. Assim sendo, as mulheres ovuladoras apresentam curvas bifásicas e anovuladores monofásicas.
Serve para fazer o controle seriado ultrassonográfico do desenvolvimento folicular. No final do ciclo anterior, os folículos são visualizados com diâmetros que variam de 2 mm a 4 mm, os assim denominados folículos antrais. Em torno do oitavo dia do ciclo, observa-se a formação do folículo dominante, que chega a ter um diâmetro médio de 18 mm a 22 mm, no período periovulatório.
Por ocasião da ovulação, ocorre a ruptura folicular, fomando-se a seguir o corpo lúteo, facilmente visualizado à ultrassonografia pélvica. Nota-se presença de líquido livre em recesso retouterino; o endométrio na fase pós-menstrual se apresenta com espessura em torno de 5 mm, que sob a ação estrogênica na fase proliferativa sofre transformação para endométrio trilaminar (8 mm a 12 mm no período estrogênico máximo – em torno do 12º dia) e para hiperocogênico na fase secretora.
Cuidados devem ser tomados em ciclos normais de 35 dias em que a ovulaçção ocorre ao redor do 20º, 21º dia do ciclo, para não se parar precocemente a monitorização ultrassonográfica diagnosticando-se, de forma errônea, falsas anovulações. Lembrar que a vida média do corpo lúteo é de 14 +/- 2 dias.
Dosagens hormonais
Primeira fase do ciclo menstrual – Reserva ovariana e função ovulatória
| Exame complementar | Indicação | Interpretação – Exame normal |
| FSH | Reserva ovariana | < 12mUI/mL |
| Estradiol | Reserva ovariana | Entre 20 e 80 pg/mL |
| Inibina B | Reserva ovariana | > 45 ng/mL |
| AMH-Hormônio antimülleriano | Reserva ovariana | 0,75 ng/mL – Ao longo do ciclo |
| Prolactina | Hiperprolactinemia | Normal – Até 20 ng/mL |
| TSH | Hiper/Hipotireoidismo | 0,35-6,7 µU/mL |
| Androstenediona | Hiperandrogenismo – ovário | 60-300 ng/mL |
| Testosterona total | Hiperandrogenismo – ovário | 20-80 ng/mL |
| S-DHEA | Hiperandrogenismo adrenal | 80-350 ng/mL |
| 17-OH-progesterona | Hiperplasia adrenal congênita | Até 4 ng/mL |
Ao analisarmos a anamnese, os exames físicos, ginecológicos e laboratoriais, podemos classificar os quadros de anovulação/oligovulação em:
Nas mulheres anovuladoras normogonadotróficas desejosas de gestação, como por exemplo as acometidas por Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP), indica-se inicialmente a realização de atividade física e redução do peso corporal em pelo menos 10%.
O primeiro tratamento de escolha para as anovuladoras que desejam gestar é a indução da ovulação com Citrato de Clomifene (CC), 50 mg/dia a 200 mg/dia, via oral, por 5 dias, do 3º ao 7º dia do ciclo, ou do 5º ao 9º dia do ciclo. O CC compete com o estrogênio endógeno pelo receptor, causando uma interpretação, via central, de hipoestrogenismo, induzindo assim o aumento da secreção de FSH pela hipófise.
A monitorização da resposta ovariana é feita pela ultrassonografia pélvica, realizada a partir do 8º dia do ciclo menstrual, para avaliar o número total de folículos em desenvolvimento, além da avaliação da espessura endometrial. Ciclos com mais de quatro folículos viáveis devem ser cancelados e o casal orientado a utilizar preservativo para não ocorrer gestação múltipla. A ovulação espontânea ocorre quando os maiores folículos atingem diâmetro de 20 mm a 22 mm.
Ao redor de 80% das mulheres apresentam ovulação com CC, sendo essa taxa inferior naquelas com idade mais avançada, índice de massa corpórea elevado e níveis androgênicos mais altos. A fecundidade durante o tratamento varia de 15% a 22%, sendo que a gestação ocorre dentro de seis meses, não se justificando continuidade do uso da droga além deste período.
Algumas mulheres não respondem a simples indução com CC, devendo-se então associar as gonadotrofinas, conforme apresentado. Orienta-se associar HMG (Gonadotrofina de Mulher Menopausada), menotropina ultrapura, FSH ultrapuro ou FSH recombinante, em dias alternados, a partir do 3º dia do ciclo (3º, 5º, 7º, 9º e, eventualmente, no 11º dia do ciclo), nas doses de 50 UI a 150 UI. O controle ultrassonográfico deve ser ainda mais rigoroso, uma vez que o uso das gonadotrofinas pode resultar no desenvolvimento de número exagerado de folículos, podendo promover a chamada Síndrome de Hiperestímulo Ovariano (SHO).
Em função do uso das gonadotrofinas com consequente elevação dos níveis de estrogênio, indica-se a aplicação do hCG urinário, na dose de 2.000 UI a 5.000 UI, ou hCG recombinante, na dose de 250 µg para maturação oocitária final e desencadeamento da ovulação. O mesmo deve ser aplicado quando os folículos atingirem 18 mm a 20 mm de diâmetro, ocorrendo a ovulação ao redor de 36 horas depois. Em função do alto custo das gonadotrofinas, quando estas são necessárias, grande parte dos serviços opta por indicar a inseminação artificial ( na ausência de outro fator de infertilidade), visando ao aumento de 5% das chances de gestação quando comparadas ao coito programado.
Pode-se optar pelo uso isolado de gonadotrofinas continuadamente, sem associações com o citrato de clomifeno. Recomenda-se iniciar com 37,5 UI a 75 UI e ir aumentando a dose a cada 7 dias, se nenhum folículo acima de 10 mm aparecer. Dificilmente nesses esquemas se utilizam doses superiores a 225 UI/dia, principalmente nas portadoras de SOP, dado o risco elevado de SHO.
A resistência periférica à insulina e hiperinsulinemia são frequentemente encontradas entre as anovuladoras, principalmente naquelas com ovários micropolicísticos.
Preconiza-se inicialmente o uso de metformina, 500 mg, três vezes ao dia, ou 850 mg, duas vezes ao dia, que aumenta a frequência de ovulações espontâneas. A metformina está indicada para casos de resistência à insulina, intolerância à glicose e diabetes não insulino-dependente. Pelos efeitos colaterais da metformina, principalmente gastrointestinais, não se indicam os agentes sensibilizantes como primeira opção de tratamento, mas sim na falha do CC isolado.
A prescrição de dexametasona 0,5 mg/dia ou prednisona 5 mg/dia poderá ser feita, visando à redução dos níveis de androgênio produzidos na suprarrenal, exercendo efeitos positivos nos ovários, ao melhorar a foliculogênese e a atividade da aromatase. Estaria indicada na falha do CC isolado com níveis de SDHEA superiores a 200 µg/dL.
Na falência da terapia convencional, pode-se indicar a indução laparoscópica da ovulação, procedimento conhecido como drilling; cauteriza-se por 2 a 4 segundos, com 200 a 300 watts de potência, 4 a 10 pontos da superfície de cada ovário. O drilling diminui a produção de androgênios e auxilia na ovulação de pacientes resistentes ao CC. Com a cauterização, diminui-se o número de folículos antrais aumentados nas portadoras de SOP, os quais são responsáveis por uma produção elevada de inibina. A inibina em altas quantidades levaria à diminuição da secreção de FSH. A sua normalização restitui os ciclos ovulatórios.Utiliza-se também a vaporização com diferentes tipos de laser, na tentativa de diminuir a formação de aderências, apesar de os trabalhos não mostrarem diferenças estatísticas no retorno à ovulação (84%) e obtenção de gestação (70%).
Após o tratamento cirúrgico, não ocorrendo o retorno da ovulação, reinicia-se o citrato de clomifeno ou as gonadotrofinas, com melhores respostas e menores riscos de síndrome de hiperestímulo ovariano.
As técnicas de reprodução assistida só devem ser empregadas em portadoras de ovários policísticos, quando a gravidez não for obtida com a indução de ovulação ou se houver outra causa de infertilidade associada que justifique a indicação desses procedimentos. Como complicação da indução ovulatória nos procedimentos em reprodução assistida poderá ser a ocorrência de gestações múltiplas e Síndrome de Hiperestimulação Ovariana grave (SHO). O uso de gonadotrofinas para indução ovulatória e em reprodução assistida deve ser prescrito por médico habilitado a diagnosticar e tratar complicações decorrentes do uso da medicação.
O hipogonadismo hipogonadotrófico se caracteriza pela falência hipofisária em produzir FSH e LH, o que leva à falha de desenvolvimento folicular com baixa produção de estrogênio. O diagnóstico do hipogonadismo hipogonadotrófico é de exclusão. A amenorreia hipotalâmica pode ser causada pela síndrome de Kallmann, quando acompanhada de anosmia. O hipogonadismo hipogonadotrófico pode também ter outras causas: anorexia nervosa, síndromes de má absorção intestinal, intensa atividade física, doença renal crônica e outras doenças crônicas graves.
Devido à ausência de produção endógena de GnRH, raramente se tem respostas com o uso de CC, sendo também uma possibilidade a aplicação pulsátil do GnRH exógeno, embora os custos e a complexidade do tratamento desta forma sejam muito elevados. A melhor opção de tratamento para induzir a ovulação no hipogonadismo hipogonadotrófico é a utilização de doses diárias de gonadotrofinas, aumentando-se paulatinamente a dose, até se obter o recrutamento e o desenvolvimento folicular desejado. Cabe lembrar que o tratamento com gonadotrofina exógena deve ser tanto com FSH quanto com LH, para estimular tanto a esteroidogênese quanto a foliculogênese. Controles de ultrassonografia pélvica são necessários, assim como está indicada a aplicação de hCG para desencadear a ovulação.
Como complicação da indução ovulatória nos procedimentos em reprodução assistida poderá ser a ocorrência de gestações múltiplas e Síndrome de Hiperestimulação Ovariana grave (SHO), já descritas.
Níveis séricos elevados de FSH, associados à amenorreia, indicam distúrbios de funcionamento do ovário. Há vários mecanismos etiológicos envolvidos nos casos de hipogonadismo hipogonadotrófico: causas genéticas, autoimunes, idiopáticas, metabólicas, infecciosas, iatrogênicas e idiopáticas. Ao se deparar com paciente com amenorreia, deve-se excluir inicialmente a gravidez. A seguir solicitar dosagem de FSH, prolactina e TSH para diagnóstico diferencial.
Nas falências ovarianas, a chance de obter gestação se da através da recepção de óvulos doados. Já nos casos de diminuição da reserva ovariana, em que o diagnóstico é feito pelas dosagens de FSH, estradiol do 2º ao 4º dia do ciclo, associadas à dosagem de inibina B, do Hormônio Antimülleriano (AMH) e à contagem de folículos antrais, esquemas podem ser tentados antes da indicação da ovo-recepção.
As causas da hiperprolactimemia podem ser divididas em fisiológicas (estresse, excesso de atividades físicas, estimulação mamária, gravidez e lactação), farmacológicas (uso de neurolépticos, antidepressivos, anti-hipertensivos, medicamentos gastrointestinais, opiáceos) e patológicas (doenças hipofisárias, pós-radioterapia, doenças sistêmicas). A restituição da ovulação vai depender ou não do tipo de afecção. Pode ocorrer espontaneamente, após correção do níveis de prolactina com o uso dos antiprolactinêmicos. A bromocriptina normaliza os níveis séricos de prolactina, sendo que a dose inicial deve ser 1,25 mg ao dia, aumentando-se gradativamente. A dose ideal varia de 2,5 mg a 15 mg, dividida em três tomadas. Nos casos em que os ciclos não se estabelecerem adequadamente, pode-se optar pelos mesmos esquemas indicados para as normogonadotróficas.
As alterações ovulatórias estão presentes de 15% a 25% dos casais, podendo atingir até 40% entre os fatores femininos. Fisiologicamente e de forma resumida, a ovulação depende da função adequada do eixo hipotálamo-hipófise-ovariana. Alterações desses eixos promovem quadros de anovulação ou oligovulação.
Informações importantes no fator ovariano são: história menstrual, que pode ser o único método para se avaliar a ovulação; puberdade tardia e menarca quando tardia frequentemente apontam para ciclos anovulatórios; ciclos regulares entre 25 e 35 dias, com sintomas pré-menstruais provavelmente são ciclos ovulatórios em 95% dos casos; ciclos menstruais com intervalos superiores a 35 dias podem indicar ciclos anovulatórios; presença da doença da tireoide; uso de medicações citotóxicas, neurolépticas, antidepressivas, entre outras, que atuam no eixo hipotálamo-hipofisário; antecedentes de cirurgias ovarianas; excesso de exercícios físicos; ganho excessivo de peso.
O exame físico e ginecológico deve ser efetuado da forma mais completa possível. Atente-se a toda a propedêutica que deverá ser aplicada, independentemente do caso a ser estudado.
Deverão ser também avaliados: Índice de Massa Corpórea – IMC (fração peso sobre altura ao quadrado – normal até 25), que quando elevado apresenta maior chance de ciclos anovulatórios; observar caracteres sexuais secundários (disgenesia gonodal); distribuição da pilificação (hiperandrogenismo); avaliação da tireoide; Acantose nigricans; secreção mamária (galactorreia na hiperprolactinemia); trofismo do colo uterino e da parede vaginal; volume do útero e dos ovários; características do muco cervical.
No ciclo menstrual normal com ciclos ovulatórios, a curva de temperatura basal se apresenta de forma bifásica. A temperatura é medida colocando-se o termômetro na região sublingual e a mensuração é realizada diariamente ao acordar. Quando o ciclo é ovulatório, a progesterona produzida pelo corpo lúteo atua no sistema nervoso central, mais especificamente nos centros termorreguladores do hipotálamo, promovendo aumento de 0,3°C a 0,5°C na temperatura basal durante a fase lútea. Assim sendo, as mulheres ovuladoras apresentam curvas bifásicas e anovuladores monofásicas.
Serve para fazer o controle seriado ultrassonográfico do desenvolvimento folicular. No final do ciclo anterior, os folículos são visualizados com diâmetros que variam de 2 mm a 4 mm, os assim denominados folículos antrais. Em torno do oitavo dia do ciclo, observa-se a formação do folículo dominante, que chega a ter um diâmetro médio de 18 mm a 22 mm, no período periovulatório.
Por ocasião da ovulação, ocorre a ruptura folicular, fomando-se a seguir o corpo lúteo, facilmente visualizado à ultrassonografia pélvica. Nota-se presença de líquido livre em recesso retouterino; o endométrio na fase pós-menstrual se apresenta com espessura em torno de 5 mm, que sob a ação estrogênica na fase proliferativa sofre transformação para endométrio trilaminar (8 mm a 12 mm no período estrogênico máximo – em torno do 12º dia) e para hiperocogênico na fase secretora.
Cuidados devem ser tomados em ciclos normais de 35 dias em que a ovulaçção ocorre ao redor do 20º, 21º dia do ciclo, para não se parar precocemente a monitorização ultrassonográfica diagnosticando-se, de forma errônea, falsas anovulações. Lembrar que a vida média do corpo lúteo é de 14 +/- 2 dias.
Dosagens hormonais
Primeira fase do ciclo menstrual – Reserva ovariana e função ovulatória
| Exame complementar | Indicação | Interpretação – Exame normal |
| FSH | Reserva ovariana | |
| Estradiol | Reserva ovariana | |
| Inibina B | Reserva ovariana | |
| AMH-Hormônio antimülleriano | Reserva ovariana | |
| Prolactina | Hiperprolactinemia | |
| TSH | Hiper/Hipotireoidismo | |
| Androstenediona | Hiperandrogenismo – ovário | |
| Testosterona total | Hiperandrogenismo – ovário | |
| S-DHEA | Hiperandrogenismo adrenal | |
| 17-OH-progesterona | Hiperplasia adrenal congênita |
Ao analisarmos a anamnese, os exames físicos, ginecológicos e laboratoriais, podemos classificar os quadros de anovulação/oligovulação em:
Nas mulheres anovuladoras normogonadotróficas desejosas de gestação, como por exemplo as acometidas por Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP), indica-se inicialmente a realização de atividade física e redução do peso corporal em pelo menos 10%.
O primeiro tratamento de escolha para as anovuladoras que desejam gestar é a indução da ovulação com Citrato de Clomifene (CC), 50 mg/dia a 200 mg/dia, via oral, por 5 dias, do 3º ao 7º dia do ciclo, ou do 5º ao 9º dia do ciclo. O CC compete com o estrogênio endógeno pelo receptor, causando uma interpretação, via central, de hipoestrogenismo, induzindo assim o aumento da secreção de FSH pela hipófise.
A monitorização da resposta ovariana é feita pela ultrassonografia pélvica, realizada a partir do 8º dia do ciclo menstrual, para avaliar o número total de folículos em desenvolvimento, além da avaliação da espessura endometrial. Ciclos com mais de quatro folículos viáveis devem ser cancelados e o casal orientado a utilizar preservativo para não ocorrer gestação múltipla. A ovulação espontânea ocorre quando os maiores folículos atingem diâmetro de 20 mm a 22 mm.
Ao redor de 80% das mulheres apresentam ovulação com CC, sendo essa taxa inferior naquelas com idade mais avançada, índice de massa corpórea elevado e níveis androgênicos mais altos. A fecundidade durante o tratamento varia de 15% a 22%, sendo que a gestação ocorre dentro de seis meses, não se justificando continuidade do uso da droga além deste período.
Algumas mulheres não respondem a simples indução com CC, devendo-se então associar as gonadotrofinas, conforme apresentado. Orienta-se associar HMG (Gonadotrofina de Mulher Menopausada), menotropina ultrapura, FSH ultrapuro ou FSH recombinante, em dias alternados, a partir do 3º dia do ciclo (3º, 5º, 7º, 9º e, eventualmente, no 11º dia do ciclo), nas doses de 50 UI a 150 UI. O controle ultrassonográfico deve ser ainda mais rigoroso, uma vez que o uso das gonadotrofinas pode resultar no desenvolvimento de número exagerado de folículos, podendo promover a chamada Síndrome de Hiperestímulo Ovariano (SHO).
Em função do uso das gonadotrofinas com consequente elevação dos níveis de estrogênio, indica-se a aplicação do hCG urinário, na dose de 2.000 UI a 5.000 UI, ou hCG recombinante, na dose de 250 µg para maturação oocitária final e desencadeamento da ovulação. O mesmo deve ser aplicado quando os folículos atingirem 18 mm a 20 mm de diâmetro, ocorrendo a ovulação ao redor de 36 horas depois. Em função do alto custo das gonadotrofinas, quando estas são necessárias, grande parte dos serviços opta por indicar a inseminação artificial ( na ausência de outro fator de infertilidade), visando ao aumento de 5% das chances de gestação quando comparadas ao coito programado.
Pode-se optar pelo uso isolado de gonadotrofinas continuadamente, sem associações com o citrato de clomifeno. Recomenda-se iniciar com 37,5 UI a 75 UI e ir aumentando a dose a cada 7 dias, se nenhum folículo acima de 10 mm aparecer. Dificilmente nesses esquemas se utilizam doses superiores a 225 UI/dia, principalmente nas portadoras de SOP, dado o risco elevado de SHO.
A resistência periférica à insulina e hiperinsulinemia são frequentemente encontradas entre as anovuladoras, principalmente naquelas com ovários micropolicísticos.
Preconiza-se inicialmente o uso de metformina, 500 mg, três vezes ao dia, ou 850 mg, duas vezes ao dia, que aumenta a frequência de ovulações espontâneas. A metformina está indicada para casos de resistência à insulina, intolerância à glicose e diabetes não insulino-dependente. Pelos efeitos colaterais da metformina, principalmente gastrointestinais, não se indicam os agentes sensibilizantes como primeira opção de tratamento, mas sim na falha do CC isolado.
A prescrição de dexametasona 0,5 mg/dia ou prednisona 5 mg/dia poderá ser feita, visando à redução dos níveis de androgênio produzidos na suprarrenal, exercendo efeitos positivos nos ovários, ao melhorar a foliculogênese e a atividade da aromatase. Estaria indicada na falha do CC isolado com níveis de SDHEA superiores a 200 µg/dL.
Na falência da terapia convencional, pode-se indicar a indução laparoscópica da ovulação, procedimento conhecido como drilling; cauteriza-se por 2 a 4 segundos, com 200 a 300 watts de potência, 4 a 10 pontos da superfície de cada ovário. O drilling diminui a produção de androgênios e auxilia na ovulação de pacientes resistentes ao CC. Com a cauterização, diminui-se o número de folículos antrais aumentados nas portadoras de SOP, os quais são responsáveis por uma produção elevada de inibina. A inibina em altas quantidades levaria à diminuição da secreção de FSH. A sua normalização restitui os ciclos ovulatórios.Utiliza-se também a vaporização com diferentes tipos de laser, na tentativa de diminuir a formação de aderências, apesar de os trabalhos não mostrarem diferenças estatísticas no retorno à ovulação (84%) e obtenção de gestação (70%).
Após o tratamento cirúrgico, não ocorrendo o retorno da ovulação, reinicia-se o citrato de clomifeno ou as gonadotrofinas, com melhores respostas e menores riscos de síndrome de hiperestímulo ovariano.
As técnicas de reprodução assistida só devem ser empregadas em portadoras de ovários policísticos, quando a gravidez não for obtida com a indução de ovulação ou se houver outra causa de infertilidade associada que justifique a indicação desses procedimentos. Como complicação da indução ovulatória nos procedimentos em reprodução assistida poderá ser a ocorrência de gestações múltiplas e Síndrome de Hiperestimulação Ovariana grave (SHO). O uso de gonadotrofinas para indução ovulatória e em reprodução assistida deve ser prescrito por médico habilitado a diagnosticar e tratar complicações decorrentes do uso da medicação.
As técnicas de reprodução assistida só devem ser empregadas em portadoras de ovários policísticos, quando a gravidez não for obtida com a indução de ovulação ou se houver outra causa de infertilidade associada que justifique a indicação desses procedimentos. Como complicação da indução ovulatória nos procedimentos em reprodução assistida poderá ser a ocorrência de gestações múltiplas e Síndrome de Hiperestimulação Ovariana grave (SHO). O uso de gonadotrofinas para indução ovulatória e em reprodução assistida deve ser prescrito por médico habilitado a diagnosticar e tratar complicações decorrentes do uso da medicação.
Níveis séricos elevados de FSH, associados à amenorreia, indicam distúrbios de funcionamento do ovário. Há vários mecanismos etiológicos envolvidos nos casos de hipogonadismo hipogonadotrófico: causas genéticas, autoimunes, idiopáticas, metabólicas, infecciosas, iatrogênicas e idiopáticas. Ao se deparar com paciente com amenorreia, deve-se excluir inicialmente a gravidez. A seguir solicitar dosagem de FSH, prolactina e TSH para diagnóstico diferencial.
Nas falências ovarianas, a chance de obter gestação se da através da recepção de óvulos doados. Já nos casos de diminuição da reserva ovariana, em que o diagnóstico é feito pelas dosagens de FSH, estradiol do 2º ao 4º dia do ciclo, associadas à dosagem de inibina B, do Hormônio Antimülleriano (AMH) e à contagem de folículos antrais, esquemas podem ser tentados antes da indicação da ovo-recepção.
As causas da hiperprolactimemia podem ser divididas em fisiológicas (estresse, excesso de atividades físicas, estimulação mamária, gravidez e lactação), farmacológicas (uso de neurolépticos, antidepressivos, anti-hipertensivos, medicamentos gastrointestinais, opiáceos) e patológicas (doenças hipofisárias, pós-radioterapia, doenças sistêmicas). A restituição da ovulação vai depender ou não do tipo de afecção. Pode ocorrer espontaneamente, após correção do níveis de prolactina com o uso dos antiprolactinêmicos. A bromocriptina normaliza os níveis séricos de prolactina, sendo que a dose inicial deve ser 1,25 mg ao dia, aumentando-se gradativamente. A dose ideal varia de 2,5 mg a 15 mg, dividida em três tomadas. Nos casos em que os ciclos não se estabelecerem adequadamente, pode-se optar pelos mesmos esquemas indicados para as normogonadotróficas.
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